25.1.10

 

25 de Janeiro
Sergio Pinheiro Lopes


Nasci um ano antes do Quarto Centenário que foi quando inauguraram o
Ibirapuera. Tinha barcos a remo e a motor no lago para passear e um restaurante ao lado do deck. Ia-se a pé por ruas de sibipirunas e tipuanas. Os Jardins podiam ser chamados de Pomares: havia ruas com jabuticabeiras, amoreiras, pés de café (tinha um na frente de casa) e muitas outras. As pajens - era assim que chamavam - andavam com os carrinhos de bebê nas praças, os táxis e os telefones eram pretos, os guarda-civis tinham uniforme azul e usavam luvas brancas e dava para jogar bola na Rua Estados Unidos. No centro da Praça das Guianas tinha uma árvore imensa e quando eu era menino dava para ficar contando os carros que passavam na 9 de Julho. Era lá que tinha a parada de 7 de Setembro e no Carnaval tinha corso na Avenida Brasil.

O Harmonia não era clube de gente metida e a Rua Canadá inundava em dia de chuva. O Morumbi não existia. A cidade acabava lá pelo Jockey Club, depois era o pasto.


Hoje ando como alma penada nessa minha cidade, arrancando pedaços de memória das poucas casas que restaram, de um quebradinho na calçada, de uma ou outra árvore. Meu Tio Julinho parava o carro naquela esquina quando vinha tomar lanche no domingo e a Casa América tinha o melhor sorvete de pistache do mundo. O primeiro supermercado da cidade chamava-se Sirvase e era na Rua Augusta. Um pouco mais para cima tinha o Cine Paulista e a primeira lanchonete que só vendia Hot-Dog com fritas e Hot Fudge Nut. Ia para o cinema, para a escola, para o clube, para visitar minha avó, tudo de bonde.

Depois veio o onibus elétrico que fazia hmmmmmmm quando acelerava. A Praça das Bandeiras chamava O Piques e a Rua Direita era torta. O Cine Marrocos era o mais aconchegante e a Salada Paulista, na Avenida Ipiranga, era restaurante de gente educada. Comia-se bem. Tinha a Praça da República e flores no Largo do Arouche - acho que ainda tem. As meninas do Externato Meira eram as mais galinhas e o Consulado Americano ficava no Conjunto Nacional, aquele, que tinha o relógio da Willis (Overland do Brasil). O crioulo que fazia as entregas da Mercearia Vera chamava-se Sagui e todo dia era possível cruzar com o escocês e seu coolie. O tempo era nublado e sempre garoava. A cidade era mais fria e as pessoas mais quentes. Dormia-se de janela aberta e meu cachorro (Paddy) andava solto. Todo mundo conhecia.

Todas as ruas eram de paralelepípedos e esses meus cabelos brancos são apenas um disfarce, nunca cresci: continuo menino e continuo contando os carros.

Hoje é aniversário de São Paulo.

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