31.7.11

 

Reinvenção
Cecília Meireles



A vida só é possível reinventada.

Anda o sol pelas campinas
e passeia a mão dourada
pelas águas, pelas folhas...
Ah! tudo bolhas
que vem de fundas piscinas
de ilusionismo... — mais nada.

Mas a vida, a vida,
a vida, a vida só é possível reinventada.

29.7.11

 

Filhote





Daniel e Gil na Eslovênia

28.7.11

 

Last Call
Dave Van Ronk






And so we’ve had another night
of poetry and poses,
and each man knows he’ll be alone
when the sacred ginmill closes.

And so we’ll drink the final glass
each to his joy and sorrow
and hope the numbing drunk will last
'til opening tomorrow.

And when we stumble back again
like paralytic dancers
each knows the question he will ask
and each man knows the answers.

And so we’ll drink the final drink
that cuts the brain in sections
where answers never signify
and there aren’t any questions.

I broke my heart the other day.
It will mend again tomorrow.
If I’d been drunk when I was born
I’d be ignorant of sorrow.

And so we’ll drink the final toast
that never can be spoken:
Here’s to the heart that is wise enough
to know when it’s better off broken.

 

Última Rodada
Sergio Pinheiro Lopes





Segunda para terça-feira, 20 de julho de 2004. 03:45 da manhã:
Saio do bar, logo antes da ponte que passa sobre a avenida. O carro, estacionado praticamente na frente do bar, foi deixado com a luz interna acesa e está sem bateria. Peço a uns manobristas, parados conversando em frente ao bar, que me ajudem a empurrá-lo para que pegue no tranco. Enquanto isso, um desconhecido bate num carro que estava passando, e este é desviado para rente à traseira do meu veículo e atropela, com violência, uma das pessoas que estava me ajudando. Esse homem é arremessado à cerca de dez metros de distância. Antes que o corpo caia à minha frente, vejo de relance um veículo pequeno e de cor escura que desaparece em alta velocidade. A visão do corpo que cai impede que eu veja a placa. Na colisão, o automóvel agressor perde seu espelho retrovisor direito que fica na pista.

O resgate é chamado. Vários minutos depois, a vítima é levada para o PS do Hospital das Clínicas, onde é encaminhada, com politraumatismo, à UTI.



Domingo, 18 de julho de 1993.
12:30:
Meu pai morre atropelado na esquina da alameda Lorena com a avenida 9 de Julho.




Domingo, 18 de julho de 2004.
11:30:
Aniversário de 11 anos da morte de papai.

Fomos, minha mãe, meu irmão e eu, à missa que meu pai havia assistido em seu último dia. Assistimos em silêncio sentido, a mesma cerimônia. Como todos os anos, logo de manhãzinha eu tinha ido colocar uma rosa em seu túmulo.



Segunda para terça-feira, 20 de julho de 2004. 03:31 da manhã:
Recebo o ticket do Mastercard: 14 reais.

Assino e devolvo.
Ainda não sabia, mas tinha acabado de pagar meu último uísque.

27.7.11

 

Retratos Escritos
Sergio Pinheiro Lopes



Tenho um colete de pescador que comprei em uma viagem a Portugal.
Possui exatos vinte e sete bolsos, vários lugares para iscas, pendurar anzóis e coisas que nem imagino.

Comprei por vinte e cinco dólares porque me pareceu ideal para quem está viajando. Como se sabe, viajar é andar a pé. E muito. Esse colete pareceu-me uma solução bestial, como se diria lá na terrinha. Nos seus bolsos pude colocar o jornal do dia, carteira, passaporte, mapas, folhetos, livros, cigarro, isqueiro, máquina fotográfica, óculos de leitura e escuros e até mesmo uma malha levinha, caso esfriasse durante o dia.
Perfeito. Sem mangas, naturalmente, e furadinho atrás para ventilar, permitiu-me carregar todo o meu kit de viagem, com o peso distribuído pelo corpo uniformemente e, ao mesmo tempo, ficar com as mãos e os braços livres para passear, fuçar em livrarias, sentar em um café de beira de calçada e, com sorte, não me parecer em demasiado com um turista.
Tudo isso para dizer que, uma vez findo o passeio, o colete permaneceu como uma das minhas melhores aquisições de viagem.
Às vezes, quando o clima está ameno, nem frio e nem calor – o que é uma raridade em São Paulo – acho de usá-lo por aqui mesmo. É bom para aqueles sábados ou domingos em que se sai para garimpar livrarias e sebos, comer qualquer coisinha fora, xeretar em uma das feiras ao ar livre, que são, aliás, uma das graças de São Paulo atualmente, e eventualmente, até terminar com um cafezinho entre amigos em algum lugar no fim da tarde. Programa para o dia inteiro, portanto, em que o tal do colete vem bem a calhar.
Pois bem. Outro dia, estava eu todo pimpão com o referido, acho que em um café depois do comer qualquer coisinha fora, quando me perguntaram: “Você é fotógrafo?”
Respondi que não. Mas nunca tinha me ocorrido que ele é em tudo semelhante a um colete de fotógrafo. Bateu-me o sprit d’escalier, e achei que deveria ter dito que sim, que era, mas um tipo diferente de fotógrafo, já que minhas fotos são feitas com palavras. Mas fotografo o que vejo. Pareceu-me justo descrever esses curtos textos que produzo como retratos em branco e preto, isto é, imagens reveladas pelo texto, mostradas não em cromo, mas em papel e tinta. Pinturas, dirão alguns. Fotografias, digo eu, pois as crônicas, como as fotos, comportam pontos de vista peculiares, ângulos incomuns e permitem que se enfatizem detalhes que talvez passem despercebidos por outras pessoas. Mas não são, como as pinturas, uma interpretação do autor. Não são ficção. Estão mais para micro-autobiografias do que para qualquer outra coisa. E mais: senti que tinha o direito usar a peça de vestuário como se fosse mesmo um fotógrafo, mas, diferentemente deste, sem precisar de flash, filme ou câmera para tirar um instantâneo da realidade do bolso do colete.
Afinal, sou cronista e tiro retratos por escrito.

 

Flowers Never Bend With The Rainfall
Paul Simon





               

Through the corridors of sleep
Past the shadows dark and deep
My mind dances and leaps in confusion.
I don't know what is real,
I can't touch what I feel
And I hide behind the shield of my illusion.

So I'll continue to continue to pretend
That my life will never end,
And flowers never bend
With the rainfall.

The mirror on my wall
Casts an image dark and small
But I'm not sure at all it's my reflection.
I am blinded by the light
Of God and truth and right
And I wander in the night without direction.

So I'll continue to continue to pretend
That my life will never end,
And flowers never bend
With the rainfall.

It's no matter if you're born
To play the King or pawn
For the line is thinly drawn 'tween joy and sorrow,
And so my fantasy
Becomes reality,
And I must be what I must be and face tomorrow.

So I'll continue to continue to pretend
That my life will never end,
And flowers never bend
With the rainfall.


Pelos corredores do sono

Depois das sombras escuras e fundas

Minha mente dança e salta em confusão

Eu não sei o que é real

Eu não consigo tocar no que sinto

E me escondo atrás do escudo da minha ilusão


Então vou continuar a continuar a fingir

Que minha vida nunca vai acabar

E que as flores nunca se curvam

Com a chuva


O espelho na minha parede

Mostra uma imagem pequena e escura

Mas não tenho certeza nenhuma que é o meu reflexo

Sou cegado pela luz

De Deus e da verdade e do que é certo

E vago pela noite sem direção


Então vou continuar a continuar a fingir

Que minha vida nunca vai acabar

E que as flores nunca se curvam

Com a chuva


Não importa se você nasceu

Para ser o Rei ou o peão

Pois a linha é tênue entre a alegria e a tristeza

Então minha fantasia

Se torna realidade

E eu tenho de ser o que tenho de ser e encarar o amanhã


Então vou continuar a continuar a fingir

Que minha vida nunca vai acabar

E que as flores nunca se curvam

Com a chuva


24.7.11

 

The Windmills of Your Mind
Michel Legrand
Dusty Springfield




23.7.11

 

União
Caxig



O que nos une

São os ressentimentos e

Nada mais


Mágoa

Auto-piedade

Depressão


Matérias mortas

Que a tudo em volta

Contamina e

Apodrece


O presente permanente é

O único

Antídoto e nele

Não existimos


 

Portrait
Retrato
Sergio Pinheiro Lopes



An aristocrat from the tropics,
mild of manner and educated,
albeit not formally;
who should be kept away from alcohol
not to flood unprepared ears
with harsh observations
usually best left unsaid;
excelling in the language and culture
of the forefathers, at least
four generations removed,
he walks and lives:
a fake pearl amidst real swine.

Um aristocrata dos trópicos,
de boas maneiras e educado,

embora não de modo formal;
que deveria ficar longe do álcool;
que não deveria encher ouvidos
desprevenidos com falas
severas, melhor se não ditas;
primando na língua e na cultura

de seus antepassados, ao menos
quatro gerações já idas,
ele caminha e ultrapassa os anos:

pérola falsa entre legítimos suínos.

(Tradução para o português de Marcelo Tápia)

21.7.11

 

Backstage Pass
Johnny Cash





Hello, I'm Johnny Cash 
One night I had a backstage pass
To a Willie Nelson show

There were wackoes and weirdoes and dingbats and dodoes
And athletes and movie stars and David Allan Coe
There was leather and lace and every minority race
With the backstage pass to the Willie Nelson show

Kristofferson got an offer for a movie
Promoters closed another deal or two
Waylon got a call from his son Shooter
And he went home the minute he was through

I moved with the mob at intermission
To the green room where you see who you can see
There were has-beens and would-bes and never-weres
Paupers, punks and millionaires and me

And there were wackoes and weirdoes and dingbats and dodoes
And athletes and movie stars and David Allan Coe
There was leather and lace and every minority race
With the backstage pass to the Willie Nelson show

Hell's Angels blocked the traffic to the building
In order for the beer truck to come through
And waitin' in the wings to sing with Willie
Were hopeful stars of flickering magnitude

There was a singer Willie knew back in the fifties
Who once paid him fifty dollars for a song
There were women who once did and some who still would
I heard one ask, "Did Connie come along?"

And there were wackoes and weirdoes and dingbats and dodoes
And athletes and movie stars and David Allan Coe
Leather and lace and every minority race
With the backstage pass to the Willie Nelson show

I wish you could've been there,
But maybe you were

20.7.11

 

A Woman Waits For Me
Walt Whitman



A woman waits for me--she contains all, nothing is lacking,
Yet all were lacking, if sex were lacking, or if the moisture of the
right man were lacking.

Sex contains all,
Bodies, Souls, meanings, proofs, purities, delicacies, results,
promulgations,
Songs, commands, health, pride, the maternal mystery, the seminal
milk;
All hopes, benefactions, bestowals,
All the passions, loves, beauties, delights of the earth,
All the governments, judges, gods, follow'd persons of the earth,
These are contain'd in sex, as parts of itself, and justifications of
itself.

Without shame the man I like knows and avows the deliciousness of his
sex,
Without shame the woman I like knows and avows hers.
...

 

Go to Hell
David Ford



Um take só



 

Passarinho
Sergio Pinheiro Lopes



O bom da vida
Consegue-se como se
Consegue a confiança de
Um passarinho.
Com paciência, com o
Coração puro, esquecido de
Si mesmo. E,
Com o saber que, às vezes,
Não se consegue.
E o sol, como que de acordo, nasce e
Põe-se todos os dias.

18.7.11

 

Solitary Man
Neil Diamond
Johnny Cash





Melinda was mine 
'til the time
that I found her
Holdin' Jim
and lovin' him
Then Sue came along
loved me strong
that's what I thought
Me and Sue
But that died, too
Don't know that I will
but until
I can find me
A girl who'll stay
and won't play
games behind me
I'll be what I am
A solitary man
A solitary man

I've had it to here -
being where
love's a small word

A part time thing
A paper ring
I know it's been done
havin' one
girl who loves me
Right or wrong
Weak or strong

Don't know that I will
but until

I can find me

the girl who'll stay

and won't play

games behind me

I'll be what I am

A solitary man

A solitary man

 

Dad
Sergio Pinheiro Lopes



Era como se fosse o nome dele para mim. Provavelmente herança de meu irmão mais velho que aprendeu a falar nos Estados Unidos e já o chamava assim quando nasci. Esse seu nome. Dad. Digo-o em voz alta, como se estivesse entrando em casa. Nunca mais havia feito isso. Uma onda de emoção me obriga a levantar para enxugar os olhos e assoar o nariz com um pedaço de papel higiênico.
Dad: Barbeava-se colocando a língua entre os lábios no canto da boca. Parecia que estava fazendo uma coisa que exigia especial habilidade.
Lembro-me de vê-lo à distância, parado em frente a uma banca de livros usados na praça Dom José Gaspar. Sempre de terno e, em geral, cinza. A cabeça inclinada para frente, atento ao livro. Vê-lo para mim trazia certeza, aconchego, segurança, firmeza, calor. Ele tornava o mundo razoável, um lugar que tinha esperança.
Parou de fumar e de beber álcool aos 55 anos. Depois disso nem bolo com passas ao rum. Até então tinha predileção por gim-tônica.
Ele brigando com a guilhotina de uma janela emperrada, muito engraçado, lembrança de criança.
Tenho uma foto dele de casaco de nylon e chapéu em Land’s End. No fim do mundo. Tenho outra dele lendo em sua biblioteca. Uma ilha de reflexão cercada de livros por todos os lados. Deu-me, entre muitos, El Libro Del Consuelo Divino, de Meister Eckehart. Escrevia suas iniciais no canto superior direito, traço diagonal embaixo e a data. No fim do livro a mesma coisa, com a data de término da leitura. MBL.
Veio de Minas para estudar e morar no Colégio São Bento aos treze anos. Não sei quem me disse que ficava no colégio enquanto todos os outros meninos iam para casa nas férias. Solidão. Forja.
Disse-me, nos meus dezessete, que todos os problemas da vida deveriam vir nesta idade, quando se sabe tudo. Falou a mesma coisa sobre os cinqüenta anos, em outra ocasião. Ensinou-me também que um dos piores fracassos é ter sucesso naquilo que não se quer.
Quando mencionei a ele que queria ser feliz, fez um muxoxo e decretou que era bobagem, que felicidade não existe. Quando perguntei o que era marxismo, fez apenas um “pfué” de desprezo e recomendou que me informasse sobre os liberais do século dezessete.
Ele de cuecas, passando uma calça na cozinha de minha casa em Cambridge, às gargalhadas, lembrando uma entrevista com o Peter Ustinov. Gostou da minha surpresa com essa habilidade inimaginada.
Não falava de si. Depois soube que ajudara muitas pessoas ao longo da vida. Dele, nenhuma palavra a respeito. Nunca.
Hoje diríamos que estressava. Na época o termo familiar era neurastênico. Ele era um pouco, às vezes. Tinha uma predileção por cadeiras quando estava muito nervoso. Levantava e depois batia com elas no chão. Deve ter quebrado umas tantas durante a vida.
Tinha um retrato do pai na parede atrás de si no escritório da cidade. Sentia dificuldade em falar dele sem embargar a voz. Referia-se a ele como “papai”.
Trancava a casa antes de dormir, todas as portas e janelas, e verificava se o gás estava desligado.
Não era de muitos abraços e beijos, ficava quadrado. As exceções eram os netos.
Adorava livros e, entre esses, os seus. Livros e discos de música clássica eram seus únicos objetos de desejo, seus solitários itens de consumo. Tinha a habilidade de re-arrumar os livros até sobrar uma prateleira para acomodar mais.
Lia o tempo todo, digo, todo o tempo livre, que não deve ter sido muito por grande parte da vida.
Um homem de inteligência brilhante e generosa, com poucos interlocutores à altura. Conversava com os livros. Pensava com rigor. Escrevia magnificamente. Claro, conciso, certeiro.
Não falava do que não entendia e media as palavras com o cuidado de um ourives. Não era de muitas palavras, mas elas podiam ser ferinas e machucar como uma chicotada quando ele queria.
Um mão-aberta, não ligava para dinheiro. Quando tinha, dava. Quando não tinha, dizia. Mas mesmo assim, por vezes dava um jeito. Depois de me negar um revolver de brinquedo, por caro, levou-me até a Casa Capricho pela manhã e deu-me o presente. Custou quatro cruzeiros e eu nunca esqueci.
Poucas vezes perdeu a paciência comigo de vez. Uma foi quando comparei a Santa Ceia a um ritual de canibalismo. Bateu com o guardanapo na mesa e subiu para o escritório indignado.
Foi deixando de ter amigos ao longo da vida, até ficar sem nenhum. Poucas pessoas o encantavam. Maria Júlia era uma. Os filhos e as noras, outros. Os netos então, nem se fala. Um homem de família.
O dever era para ele inquestionável. A gente faz o que tem de fazer, dizia, e acabou-se.
Dizia para mim que não temesse, pois era indestrutível. Acreditei e ele não me enganou. Hoje ele mora aqui, dentro de mim, indestrutível.
Um dos netos chamou-o uma vez de Lobo Mauro. Adorou. Contou-me que Lopes queria dizer filho de lobo. Havia uma fotografia de um cachorro chamado Lobo atrás da porta da casa de sua mãe. Durante um tempo, na infância, eu tinha medo de escuro e de lobo. Ele acendia a luz e me fazia companhia até que adormecesse.
Foi embora num domingo, depois da igreja. Depois de comungar. Em paz com Deus. Foi sem deixar ponta solta para trás. Deixou-me farto consolo: sua memória.
Havia falado com ele, por telefone, de Ubatuba, no dia anterior, para dizer que tinha chegado bem. Um acordo de vida inteira entre nós dois, não deixá-lo sem notícias de mim. Foi assim até o fim.
Tenho uma fita de secretária eletrônica com sua voz gravada. Ele mal fala. Mas está lá. Olho para ela de soslaio, sem coragem de ouvir.
Acordo de vez em quando, no meio da noite, e parece que ouço seu ressonar no quarto ao lado. Mais de uma vez achei tê-lo visto na rua de relance. Já o ouvi me chamar várias vezes. Primeiro o susto, depois o aperto no coração.
É difícil que passe um dia sem que eu me lembre dele.
São seis horas da manhã lá fora.
Faz dezoito anos que é assim.

16.7.11

 

Dizem
Sergio Pinheiro Lopes



Talvez seja melhor não ter filhos. O bom da vida é viajar.
O segredo está na moderação.

Comer de tudo, mas não muito. Tomar sol, fazer ginástica e escovar os dentes depois das refeições.
Ser cordato, combinar as cores e nunca usar bege. Bege é só cor de parede.
Estudar inglês, acertar o relógio pelo funcionamento do intestino e, à noite, comer só coisas leves.
Amores da noite não florescem sob a luz do sol, amor de verão não sobe a serra
e quem nunca chorou por amor não viveu.

Ler pelo menos um livro por mês, lavar os cabelos todos os dias,
e não deixar passar muito tempo sem telefonar para os amigos.

Viajar em feriado prolongado é fria, o negócio é viver no contra-fluxo.
Não se fala de dinheiro à mesa e é pecado mortal criticar o último namorado dela.

Fila dupla é falta de cidadania, não se buzina perto de hospital
e o carro deve andar razoavelmente limpo.

Ver muita televisão faz mal, cigarro só depois do meio-dia, faltar à análise é auto-sabotagem.
Ler horóscopo, tudo bem. Mesmo que não acredite. Melhor até se não acreditar.

Nunca ir ao supermercado com fome. Quanto mais colorido o prato, mais saudável.
O Mercado Municipal é incrível. Principalmente os vitrais.

Sapatos e cinto devem combinar.
Meia da mesma cor dos sapatos também é bom. Um acessório discreto dá personalidade.
Deus está nos detalhes.

É mais gostoso sair durante a semana. Sábado à noite está tudo lotado.
Fim-de-semana é para ficar em casa, visitar amigos ou então viajar por perto.

São Paulo tem lugares que ninguém conhece.
Uma réplica do Templo Dourado de Kioto, por exemplo,
com pequenos lagos artificiais habitados por carpas coloridas.

Ir comer pizza no Brás, segunda à noite, é um grande programa.
Mas se for com alguém que você gosta e que nunca fez isso, é claro.

Fazer um dia inteiro de jejum de vez em quando para limpar o organismo.
Feng-shui funciona e é agradável aos olhos.
A gente nunca sabe, mas é bom prestar atenção sempre.
É o que dizem.

 

Arre!
Caxig



A clareza do Universo mora
No meu silêncio interior
No cessar do
Diálogo interno
Na atenção
Individida

Mas como é difícil,
Arre!

 

Le Télégramme
Yves Montand
Simone Signoret




 

Les Feuilles Mortes
Yves Montand




Oh je voudrais tant que tu te souviennes
Des jours heureux où nous étions amis
En ce temps là, la vie était plus belle
Et le soleil plus brûlant qu'aujourd'hui
Les feuilles mortes se ramassent à la pelle
Tu vois je n'ai pas oublié
Les feuilles mortes se ramassent à la pelle
Les souvenirs et les regrets aussi
Et le vent du nord les emportet
Dans la nuit froide de le l'oubli
Tu vois, je n'ai pas oublié
La chanson que tu me chantais

C'est une chanson, qui nous ressemble
Toi tu m'aimais, et je t'aimais
Et nous vivions tout les deux ensemble
Toi qui m'aimais, moi qui t'aimais
Mais la vie sépare ceux qui s'aime
Tout doucement sans faire de bruit
Et la mer efface sur le sable
Le pas des amants désunis

Mais la vie sépare ceux qui s'aime
Tout doucement sans faire de bruit
Et la mer efface sur le sable
Le pas des amants désunis.

14.7.11

 

Logorama
François Alaux,
Hervé de Crecy & Ludovic Houplain




13.7.11

 

A Little at a Time
Johnny Cash






Stop lovin' me,

A little at a time,

Let me lose you,

A little at a time

Walk away slow

Like you don't wanna to go

Leave me

A little at a time



For my benefit

Try to cry a little bit

For old times sake

Give me a slow heartbreak

I'll put up a fight

But I'll be all right

If you stop lovin' me

A little at a time



Hurt me

A little at a time

Turn me away

A little at a time

Walk away slow

Like you don't wanna to go

Leave me

A little at a time



For my benefit

Try to cry a little bit

For old times sake

Give me a slow heartbreak

I'll put up a fight

But I'll be all right

If you stop lovin' me

A little at a time



A little at a time

A little at a time

A little at a time





Pare de me amar

Um pouquinho por vez

Deixe-me perdê-la

Um pouquinho por vez

Se afaste devagar

Como se não quisesse ir

Deixe-me

Um pouquinho por vez



Para meu benefício

Tente chorar um tanto

Pelos velhos tempos

Me dê uma tristeza vagarosa

Eu vou resistir

Mas vou ficar bem

Se você parar de me amar

Um pouquinho por vez



Me machuque

Um pouquinho por vez

Me afaste

Um pouquinho por vez

Se afaste devagar

Como se não quisesse ir

Deixe-me

Um pouquinho por vez



Para meu benefício

Tente chorar um tanto

Pelos velhos tempos

Me dê uma tristeza vagarosa

Eu vou resistir

Mas vou ficar bem

Se você parar de me amar

Um pouquinho por vez


Um pouquinho por vez

Um pouquinho por vez

Um pouquinho por vez


(Foi bom assim, thanks)


 

It Ain't Me, Babe
Bob Dylan
Joan Baez







Go ’way from my window
Leave at your own chosen speed
I’m not the one you want, babe
I’m not the one you need
You say you’re lookin’ for someone
Never weak but always strong
To protect you an’ defend you
Whether you are right or wrong
Someone to open each and every door
But it ain’t me, babe
No, no, no, it ain’t me, babe
It ain’t me you’re lookin’ for, babe

Go lightly from the ledge, babe
Go lightly on the ground
I’m not the one you want, babe
I will only let you down
You say you’re lookin’ for someone
Who will promise never to part
Someone to close his eyes for you
Someone to close his heart
Someone who will die for you an’ more
But it ain’t me, babe
No, no, no, it ain’t me, babe
It ain’t me you’re lookin’ for, babe

Go melt back into the night, babe
Everything inside is made of stone
There’s nothing in here moving
An’ anyway I’m not alone
You say you’re lookin' for someone
Who’ll pick you up each time you fall
To gather flowers constantly
An’ to come each time you call
A lover for your life an’ nothing more
But it ain’t me, babe
No, no, no, it ain’t me, babe
It ain’t me you’re lookin’ for, babe

12.7.11

 

Caminante No Hay Camino
Antonio Machado
Juan Manuel Serrat




 

People Are Strange
The Doors





People are strange when you're a stranger 
Faces look ugly when you're alone
Women seem wicked when you're unwanted
Streets are uneven when you're down

When you're strange
Faces come out of the rain
When you're strange
No one remembers your name
When you're strange
When you're strange
When you're strange

People are strange when you're a stranger
Faces look ugly when you're alone
Women seem wicked when you're unwanted
Streets are uneven when you're down

When you're strange
Faces come out of the rain
When you're strange
No one remembers your name
When you're strange
When you're strange
When you're strange

When you're strange
Faces come out of the rain
When you're strange
No one remembers your name
When you're strange
When you're strange
When you're strange

11.7.11

 

Born at the Right Time
Paul Simon






Down among the reeds and rushes 
A baby boy was found
His eyes as clear as centuries
His silky hair was brown

Never been lonely
Never been lied to
Never had to scuffle in fear
Nothing denied to
Born at the instant
The church bells chime
And the whole world whispering
Born at the right time

Me and my buddies we are travelling people
We like to go down to restaurant row
Spend those euro-dollars
All the way from Washington to Tokyo
I see them in the airport lounge
Upon their mother's breast
They follow me with open eyes
Their uninvited guest

Never been lonely
Never been lied to
Never had to scuffle in fear
Nothing denied to
Born at the instant
The church bells chime
And the whole world whispering
Born at the right time

Too many people on the bus from the airport
Too many holes in the crust of the earth
The planet groans
Every time it registers another birth

But among the reeds and rushes
A baby boy was found
His eyes as clear as centuries
His silky hair was brown

Never been lonely
Never been lied to
Never had to scuffle in fear
Nothing denied to
Born at the instant
The church bells chime
And the whole world whispering
Born at the right time


(Oh, how I miss my sonny boy, traveling the roads of faraway lands. May he be blessed all the days of his life.)

 

Fernando Taulois
Marcelo Magalhães


 

A Little Bitty Tear
Burl Ives





A little bitty tear let me down, 
spoiled my act as a clown,
I had it made up not make a frown,
but a little bitty tear let me down.

You said you were leaving tomorrow,
That today was our last day,
I said there'd be no sorrow,
that I'd laugh when you walked away.

A little bitty tear let me down,
spoiled my act as a clown,
I had it made up not make a frown,
but a little bitty tear let me down.

I said I'd laugh when you left me,
Pull a funny as you went out the door,
That I'd have another one waiting,
And I'd wave goodbye as you go.

A little bitty tear let me down,
spoiled my act as a clown,
I had it made up not make a frown,
but a little bitty tear let me down.

Everything went like I planned it,
And I really put on quite a show,
In my heart I felt I could stand it,
Till you walked with your grip through the door, then...

A little bitty tear let me down,
spoiled my act as a clown,
I had it made up not make a frown,
but a little bitty tear let me down.

A little bitty tear let me down.

10.7.11

 

A Cúmplice
Juca Chaves






Eu quero uma mulher que seja diferente

de todas que eu já tive, todas tão iguais.

Que seja minha amiga, amante, confidente;

A cúmplice de tudo que eu fizer a mais.

No corpo tenha o Sol, no coração a Lua;

A pele cor de sonho, as formas de maçãs;

A fina transparência, uma elegância nua;

O mágico fascínio, o cheiro das manhãs.


Eu quero uma mulher de coloridos modos,

Que morda os lábios sempre que for me abraçar.

No seu falar provoque o silenciar de todos,

E o seu silêncio obrigue a me fazer sonhar.

Que saiba receber, e saiba ser bem-vinda,

E possa dar jeitinho em tudo que fizer.

E que ao sorrir provoque uma covinha linda;

De dia uma menina; à noite uma mulher.


9.7.11

 

A Bandeira
Sergio Pinheiro Lopes



Bandeira: s. f. 1. Pedaço de pano, em geral retangular, com figuras e inscrições em cores regulamentares, e que é distintivo de uma nação, estado, corporação ou partido, ou para fazer sinais. 2. Facção, partido. 3. Idéia que serve de guia a uma cruzada, teoria, partido etc. 4. Caixilho envidraçado que encima portas ou janelas e serve para dar claridade aos aposentos. 5. Inflorescência da cana-de-açúcar e do milho. 6. Expedição armada (fins do séc. XVI aos começos do séc. XVIII), para explorar os sertões, descobrir minas ou capturar índios. 7. Em autos de praça, parte móvel do taxímetro, onde ocorre a bandeirada.



Domingo à tarde. São Paulo fritando a 38 graus à sombra. Meu amigo e eu no Ibirapuera, travados no trânsito da Bienal, ele ainda com um artigo sobre um padre na cabeça. Em frente à Assembléia, a Bandeira Paulista, no topo do mastro, tremulava suada. Ele pensou em voz alta: por que treze listras e não quatorze? Eu, ao seu lado, disse: questão de proporção.
Encalorado e curioso, olhou para mim e perguntou: o que você entende disso?
Respondi: meu bisavô é o criador da Bandeira Paulista.
A freada foi tão brusca que o padre da sua próxima coluna e seu próximo compromisso foram projetados para fora de sua cabeça.
Qual é a história, perguntou, pensando nos pontos que podia ganhar com uma multa e perguntando-se que penas eram aquelas que viu voar por cima do seu carro.
Bem, a história – que é uma história de duas bandeiras na verdade, a bandeira propriamente dita e a bandeira que o autor da bandeira deu – que contei a meu amigo (ignorando as penas do pobre pombo), é a seguinte:
O famoso escritor e gramático Júlio Ribeiro idealizou e publicou a Bandeira Paulista (desenhada por seu primo Amador Bueno do Amaral), pela primeira vez, em seu jornal “O Rebate”, no dia 16 de julho de 1888, como uma proposta para a Bandeira da República que queria ver instaurada no Brasil, e que foi preterida em favor da bandeira positivista que agora temos. No entanto, foi adotada como a Bandeira da Província de São Paulo. Originalmente tinha quinze listras e por razões de proporção, fixou-se nas atuais treze listras imortalizadas por Guilherme de Almeida (tido por alguns, até hoje, como seu criador), e tornou-se popular durante a Revolução Constitucionalista de 1932.
A segunda bandeira, aquela que ninguém viu, é a seguinte:
O nome completo de Júlio Ribeiro era Júlio César Ribeiro Vaugham. Ele era filho de um americano da Virgínia, cujo avô, por sua vez, havia sido amigo pessoal de George Washington, em homenagem a quem havia dado o nome a seu filho de George Washington Vaugham. Esse, que era o pai de Júlio Ribeiro, aos dezoito anos, pegou alguns cavalos de raça que recebera de herança, e despencou para o Brasil. Quando passava pela cidade de Sabará em Minas Gerais, apaixonou-se e casou-se. Muitos anos depois, já com o filho crescido, partiu e sumiu neste mundo. Dizem que morreu na África. Júlio Ribeiro jamais o perdoou por ter abandonado a família e este foi o motivo de ter deixado de usar o nome do pai. Mas a semelhança entre o pavilhão paulista e a Bandeira Americana é por demais flagrante para escaparmos da tentação de fazer psicanálise histórica. Enfim, uma grande bandeira da parte desse nosso grande escritor.
Ignorando a fila de carros formada atrás dele, de mansinho, para não dar bandeira, estacionou por ali mesmo. Pensei em pagar um táxi a ele em vez de arriscar a que tomasse uma multa. Desisti quando pensei que com a bandeira 2 que iria ter que pagar, essa história ia acabar ficando com bandeiras demais.

8.7.11

 

A Leopoldo Lugones
Jorge Luis Borges







Los rumores de la plaza quedan atrás y entro en la Biblioteca. De una manera casi física siento la gravitación de los libros, el ámbito sereno de un orden, el tiempo disecado y conservado mágicamente. A izquierda y a derecha, absortos en su lúcido sueño, se perfilan los rostros momentáneos de los lectores, a la luz de las lámparas estudiosas, como en la hipálage de Milton. Recuerdo haber recordado ya esa figura, en este lugar, y después aquel otro epíteto que también define el contorno, el árido camello del Lunario, y después aquel hexámetro de la Eneida, que maneja y supera el mismo artificio:

Ibant obscuri sola sub nocte per umbres.

Estas reflexiones me dejan en la puerta de su despacho. Entro; cambiamos unas cuantas convencionales y cordiales palabras y le doy este libro. Si no me engaño, usted no me malquería, Lugones, y le hubiera gustado que le gustara algún trabajo mío. Ello no ocurrió nunca, pero esta vez usted vuelve las páginas y lee con aprobación algún verso, acaso porque en él ha reconocido su propia voz, acaso porque la práctica deficiente le importa menos que la sana teoría.

En este punto se deshace mi sueño, como el agua en el agua. La vasta biblioteca que me rodea está en la calle México, no en la calle Rodríguez Peña, y usted, Lugones, se mató a principios del treinta y ocho. Mi vanidad y mi nostalgia han armado una escena imposible. Así será (me digo) pero mañana yo también habré muerto y se confundirán nuestros tiempos y la cronología se perderá en un orbe de símbolos y de algún modo será justo afirmar que yo le he traído este libro y que usted lo ha aceptado.

 

O Templo de Janus
Sergio Caxig


É raro o fechar das entradas do templo de Janus.

Os dois rostos do deus,

Um mirando o Passado,

O outro o Futuro,

Falam de guerra.

A paz como Presente constante.

Somente assim

Cerram-se as portas do templo,

E os rios da vida podem correr serenos.


This page is powered by Blogger. Isn't yours?